Páginas

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Meu riso

Era a vez de rimar a vida. Pelos meus olhos amendoados escorreram lágrimas lindas, todas puras, saíram junto qualquer vestígio de infelicidade encontrada ali dentro. Pingavam no chão e eram pisoteadas pelas rimas desastrosas. Quase escorreguei no banheiro tentando um agudo, cai no riso. Fechei meus olhos depois de um filme de terror enquanto ensaboava os cabelos encaracolados, me senti criança e cai no riso. Ê esse meu riso frouxo, desabrochando ... Era menina moça, tinha bochechas coradas e se desconcertou quando o palhaço equilibrista brilhou os olhos nos seus, caiu no riso. Eu rimava meu riso no seu, eu costurei seu sorriso no meu, meu coração bateu no mesmo compasso que acompanhava o seu. Chorei seu choro, sorri seus lábios, brilhei os olhos que visavam a terna paisagem, só de passagem. Choveu a chuva e gotejou do teto na minha cabeça, gotejei de volta, revidei a chuva e sai pra dançar, cai no riso. Brinquei no balanço do parque quando chegou a noite, sorri pra lua e ela me presenteou cobrindo o escuro do céu com as suas mais preciosas estrelas, cai do riso. Rir, sorrir, agir, fugir, persistir. Nossos sorrisos costurados estavam travando meu riso, meu riso é frouxo, é solto, é o desabrochar ... Seu sorriso no meu, travava meu riso solto no mundo, mesmo meu mundo sendo o seu, meu sorriso alinhado ao teu não faria o trabalho do meu, rindo de leve pro seu. Sua falta de riso fez fugir o meu. Meu riso era seu, meu sorriso era seu, meu mundo era seu, meu desabrochar era seu. O mar preencheu meu olhar, fugiu com ele a bailar e quem devolveu foi o sol, querendo de volta o seu mar, amar, cuidar. Sumiu meu riso, chorei meu riso perdido, procurei, tentei, sufoquei e gritei. Quero meu riso. Fui rimar a vida, sem riso ela fica sem graça. Cadê meu riso, pra me fazer cair no riso? Por sentir falta do aconchego de tê-lo pra rir, sorrir, e qualquer coisa que rime com ir, pelo mundo a fora. Quero meu riso. Riso frouxo, riso solto, riso ... só riso, só isso. Quero meu riso. Fugi e descobri, desabrochou! Segui o mapa e achei, aquele bandido que não ria, nem sorria, roubou meu riso. Corri, encontrei meu riso, sendo usado pra sorrir, rir e encantar a menina da capa colorida e chapéu bonito do outro lado da calçada. Sofri, quis fugir, mas persisti, quero meu riso! Descosturei meu sorriso do seu, de linha virou retalho, te exclui do meu baralho. Quero meu riso e não saio sem ele daqui. Não rimo mais meu riso no seu, nem costuro meu sorriso no seu, nem quero seu coração no mesmo ritmo do meu, roubou meu riso, tirou meu sono, sofri a vida e o abandono. Meu riso é meu, meu sorriso é meu, meu mundo é meu, meu desabrochar é meu. Sorri solto e frouxo, desabrochei e cai no riso, rimei a vida fazendo do meu riso o início e não a partida. Cai no riso.
                                                               Rafaella Alvez 

domingo, 13 de janeiro de 2013

Carta as pressas


Meu querido Evan, escrevo-lhe esta carta com todo o meu coração. Peço que entenda o que estou sentindo, ou pelo menos tente, por mim. Hoje, exatamente hoje, fazem dezessete primaveras desde que nos vimos pela última vez. Sinto que falta um pedaço de mim desde então. Caso não se lembre, tu me prometestes o mundo, recorda-te agora? Tu detonaste o meu, mal sabendo que ja o habitava, é triste nossa história. Imagine como me sinto neste momento. Quero que saibas que regressei a cidade. Outrora passei perto daquela fonte, sim aquela que costumávamos nos encontrar todas as tardes, vi outros jovens sentados onde nós ficávamos  sentei-me ao longe e fiquei por observá-los. Senti-me jovem novamente, pude sentir o vento trazendo-me a memória o cheiro de seu suor doce de garoto. Eu sempre soube que fugir não era boa coisa, pois me colocaram doutro lado do mundo por tanto tempo, e agora cá estou a escrever-te e por morrer de saudades tuas. Queria eu estar agora escondida por entre as parreiras que nos perdíamos quando nossos pais estavam a nos procurar. Queria eu agora estar a cuidar de ti. Queria eu tanta coisa neste mísero minuto ingrato. 
Hoje tu serias meu maior companheiro, talvez se não estivéssemos tão longe, mesmo estando tão perto.  Somar a distancia ao tempo não gera um resultado muito proveitoso. Não nesse caso. Agora estou velha e minha lucidez só serve para me lembrar do quanto nós eramos felizes. Evan meu bem, fui levada muito cedo e sem delongas para me despedir de ti, quero poder explicar-lhe e desejo que tu me entenda, mais uma vez. Eu não sumi, eu não o deixei, eu não queria nada disso. Eu fui levada a força, carregaram-me para longe de ti mas meu coração ainda continuava a bater bem perto. Sempre quis que a criação de uma criança que sempre planejamos, pudesse desfrutar de um pai presente. Miguel não pode. Sim meu querido, Miguel. Como tu dizias que gostava. E assim concedi-lhe o pedido. Meus pais nunca nos aceitaram e também não foram cordiais quando souberam de minha gravidez, ainda mais de um filho teu. Então fugimos, eu mais Miguel. Conto-lhe da nossa história desde muito pequenino, e seu sonho era encontrar o pai. Cá estamos a sua procura. Espero poder encontrar-lhe no lugar de sempre, na hora de sempre, e agora com o nosso filho.
Miguel desde então tens sido belo filho, apesar de grandes contra-tempos que nos ocorreu. Evan, meu grande amor, queria pode reescrever-te tal carta, mas prefiro a folha ja amaçada e um tanto amarelada, para que tu saibas que ja se passaram anos e que estamos juntos e como uma família, como tu desejaste, como eu desejei, e como Miguel também desejou. Alzheimer não é uma doença fácil de se tratar, e tu não andas se recuperando com os remédios, e os doutores estão a desistir de ti. Mas o nosso amor é grande e não vai nos deixar abandonar uma vida. Evan, eu te amo. Com amor, de sua esposa Iolanda. 

                                                                      Rafaella Alvez

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

As vezes se surpreender não é tão ruim

Eu sempre achei incrível poder escrever sobre as quatro estações e retratá-las de forma espetacular nos meus textos de garota. Mas hoje resolvi pintá-las, inciei meu quadro com um borrão de tinta alaranjado, joguei um pouco de amarelo e derrubei umas gotinhas em vermelho, e aquilo era o meu outono em brasa! Noutro canto retratei exatamente como são os mais belos flocos de neve que pude me lembrar das viagens que fiz, um pouco de azul e um bocado de branco e o meu inverno estava representado, quase que me fazendo sentir um pouco de frio. Misturei o rosa, o marrom, um tiquinho do verde e uma gotícula minuscula do amarelo e ali surgiu a tão famosa primavera, fazendo então em mim desabrochar a flor que estava prestes a ir buraco a baixo. Havia um espacinho em branco ainda no meu quadro, faltando uma pintura e uma estação, eu estava a preencher a lacuna, pretendia borrar um pouco das cores que usei no outono, e usar algumas cores que eu ainda não fazia idéia. Quando a porta bateu fortemente na cozinha. Com o meu macacão de pintura todo sujo de tinta, e os pincéis nos grandes bolsos, saí depressa com um deles na boca e outro na mão, cabelo desajeitado e descalça. Não era nada, além do vento. Agora tomava água observando a vista da janela da cozinha, me parabenizando mentalmente por ter feito tal escolha, quando ouço um ruído vindo das escadas. Um pouco desconfiada, subo devagar e ouço rangidos no chão de madeira, entrando no longo corredor, vejo algumas pétalas de margaridas, bem semelhantes as pétalas de girassóis, mas eram de margaridas, eu saberia diferenciar em qualquer lugar, mesmo longe. Curiosa, ouço uma música baixa e lenta vindo do último quarto. Esse momento foi assustador e instigador, aquele quarto era vazio, aliás, eu só usava para pendurar meus quadros, que cobriam quase que todas as paredes do cômodo. Entrando desconfiada, encontro meu espelho um pouco a frente da entrada da porta. Me observando do banheiro, pude ver seu reflexo se aproximando de mim, e senti-lo me abraçar cochichando ao meu ouvido, enquanto tremia. Me fez parar no centro do quarto, e colocou o espelho a nossa frente, e pediu-me delicadamente, ainda me abraçando forte e tremendo, que pintasse nós dois juntos, na situação que nos encontrávamos, e sendo mais abusado ainda, pediu-me que depois fizesse uma história para aqueles que eu pintaria. Me deu um beijo doce. Com seus olhos ternos e decididos disse que realizaria a história dos dois jovens do quadro. Aprendi naquele verão, a não desperdiçar tinta, e pintar o necessário, e você me ensinou a pintar a nossa história. 

                                                                    Rafaella Alvez

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Tudo novo de novo


Com o quarto escuro eu escrevia com um fio de luz vindo do computador onde ele estava, era difícil enxergar as linhas assim. A cama estava apertada e o clima quente. É que no escuro tudo tem jeito mais perigoso, mais cativante, causa adrenalina, fazendo ferver o sangue dentro do corpo, arfando a voz da persuasão vai sussurrando leve e intrigante-mente ao pé do seu ouvido. É que as vezes uma boa xícara de café, numa cadeira de balanço aconchegante cai bem, e a chuva vem a calhar. Era o seu sorriso tímido e a pose desconcertada em frente ao piano que me cativava ainda mais. O único problema é que você não sabia disfarçar os olhos ... justo os olhos! Seu sorriso vinha na minha direção e isso bastava para que eu me sentisse ali com você. Se o silêncio preencher minhas linhas, eu sei que posso descrevê-lo como o herói que fragmenta cada texto meu. Eu desejava que não houvesse gravidade, nem o relógio cronometrando qualquer tempo que ainda nos reste. 
Eu acho bonito quando te escondo por trás de algum texto meu, acho bonito por que depois quando me perco lendo-os eu te vejo em cada traço da minha caligrafia torta. O escuro deixa o quarto agora, e eu apago aquela minha vela perfumada, aquela que você nunca nem ouviu falar. Escrevo evasivamente e te faço meu escudo, o tempo chuvoso me agrada. E eu apenas queria você aqui me fazendo companhia. Era da sua voz que eu sentia sede, eram dos teus olhos, do teu sorriso. Mantenha-se forte eu repetia. Era como os seus dedos percorriam com delicadeza e ousadia as teclas brancas e pretas, e me prendia tanto a atenção. Em grande façanha, você me ganha, assanha, acompanha. Entranhado nos meus pensamentos, você não sai, não dá sossego, não peço por desapego. Os fogos de artificio cessavam todo e qualquer silêncio que predominava o ambiente, e naquele momento eu realmente pude sentir que como último dia do ano, o tempo estava me desejando sorte com o próximo. E quando aquele brilho colorido irradiou o céu escuro, eu pude realmente ter toda a convicção de que coisas memoráveis e indescritíveis eu estaria por viver. E sem mais delongas eu te inclui nisso!

                                                                       Rafaella Alvez

Ps: Estou adorando colocar ps's nos últimos textos né, hahaha! Enfim, quero mesmo é dizer que espero que o ano de vocês tenha começado tão bom e em grande estilo quanto o meu. Happy New Year Guys ;)